Como parte da segunda fase da Reforma Tributária, o Ministério da Fazenda apresentou o Projeto de Lei 1.087/2025, que cria o chamado “Imposto de Renda da Pessoa Física Mínimo” (IRPFM), voltado a contribuintes com rendimentos anuais superiores a R$ 600 mil. Na prática, trata-se de um “jeitinho” de instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) sem o rito adequado previsto na Constituição Federal.
A proposta impõe uma alíquota mínima efetiva sobre uma base de cálculo artificialmente ampliada, que inclui até rendimentos hoje isentos, como, por exemplo, a tributação dos dividendos. A narrativa oficial do governo é que a mudança terá como objetivo zelar pela justiça fiscal e redistribuição de renda.
O desenho do projeto revela “cheiro” de IGF, “cor” de IGF, “consistência” de IGF e “aparência” de IGF. Não seria IGF?
A tentativa de embutir esse mecanismo dentro do Imposto de Renda sem observar os limites constitucionais equivale, na prática, à criação disfarçada de um tributo novo e, consequentemente, inconstitucional
O IGF é um tributo previsto na Constituição cuja finalidade é tributar o patrimônio acumulado por pessoas com elevada capacidade econômica. Diferentemente dos impostos sobre renda ou consumo, ele incide sobre a totalidade dos bens e direitos de um contribuinte, considerando seu valor líquido. Acontece que esse tributo nunca foi instituído na prática, por decisão do Congresso.
Preferências ideológicas à parte, a realidade jurídica é uma só: a tentativa de criar algo semelhante ao IGF por meio de lei ordinária, como no caso do IRPFM, viola a Constituição Federal. Certos tributos só podem ser instituídos por meio de Lei Complementar e o IGF é um deles.
Leis complementares e leis ordinárias se distinguem em dois aspectos principais: um relacionado ao conteúdo e outro ao processo de aprovação. No campo material, a Constituição determina expressamente os temas que devem ser regulamentados por lei complementar — como no caso do IGF.
Já a lei ordinária é usada para disciplinar as demais matérias que não exigem um tratamento específico ou mais rígido indicado pela Constituição, funcionando como a regra geral dentro do processo legislativo.
Do ponto de vista formal, a diferença central está no número de votos necessários para aprovar cada tipo de norma. Uma lei complementar só é aprovada com o apoio da maioria absoluta dos membros da respectiva Casa Legislativa — o que significa mais da metade do total de parlamentares, independentemente do número de presentes. Já a lei ordinária exige maioria simples, ou seja, a maioria dos votos dos parlamentares presentes à sessão, respeitado o quórum mínimo.
O IRPFM se assemelha, na essência, a um tributo sobre o patrimônio. A base de cálculo é artificialmente ampliada. O projeto, assim, cria o IGF dentro do Imposto sobre a Renda de Pessoa Física.
O Executivo estima que a medida afetará 141 mil pessoas e beneficiará 14 milhões com isenção ou redução do IR, até a faixa de R$ 5 mil. Ainda assim, a proposta esbarra em vício de origem, pois não há na Constituição flexibilização para se buscar justiça fiscal por descumprimentos de normas constitucionais.
O respeito às normas constitucionais é essencial em um Estado Democrático de Direito. Se o objetivo é tributar os mais ricos, claramente o caso do IRPFM, o caminho correto é a instituição do IGF. Mas isso só pode ser feito por lei complementar. Não se pode aceitar o desrespeito ao texto constitucional, com o uso do IR como atalho para um imposto híbrido, que mistura renda e patrimônio.
Ainda que os fins possam ser bem-intencionados como alega o Governo Federal, os meios escolhidos para alcançá-los destoam das regras constitucionais.
O respeito à Constituição Federal é condição indispensável para a legitimidade de qualquer política fiscal. Mas o que se vê, mais uma vez, é um governo apelando ao “jeitinho” para cobrir a gastança de uma política fiscal populista.
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